Quem assistir ao desfile da Cavalera neste primeiro dia de SPFW terá mais do que uma experiência de moda: terá também a chance de conhecer um pouco da cultura Yawanawá, uma tribo indígena que vive às margens do Rio Gregório, no município de Tarauacá, no Acre.
Diversos índios da tribo Mutum, liderados pela cacique Mariazinha e pelos pajés Matsini e Hushahu, estarão na passarela entoando seus cantos poderosos em uma espécie de desfile-ritual em que a trilha será composta ao vivo pelas vozes dos índios.
No ano passado, Alberto Hiar, fundador e diretor criativo da Cavalera, fez um mergulho na cultura Yawanawá durante o festival anual que a tribo promove e que celebra a vida, a cura e a tradição indígena, que inclui rituais com o Uni, quando se ingere um chá feito à base de ayahuasca.
Sobre a experiência com o Uni, Hiar conta que foi reveladora. “Nunca fumei nem um baseado. Sou um cabaço nessa área”, brinca. “Mas essa vivência foi uma das coisas que me levou pra lá, pois eles fazem tudo em cima de um trabalho espiritual. Fiquei com medo até os 45 do segundo tempo, ficava pensando se tomava ou não. O pajé me deu muita confiança e eu tomei. Senti uma dor muito grande no peito, que só saiu depois que tive um refluxo.”
Como Alberto ressalta, nada acontece por acaso. Dizem que essa viagem à aldeia acontece com quem, de fato, precisa vivenciar a experiência. O percurso não é nada confortável e dura 24 horas, sendo que durante oito horas você passa sentado em uma voadeira — os barquinhos que navegam por ali. Chegando lá, não há energia elétrica, banheiro, a comida não é a que estamos acostumados e há muitos, muitos mosquitos que nem o repelente mais forte afasta. “Eu já queria ir de helicóptero! Falava: liga pro governador, não vou de voadeira, 24 horas viajando é massacrante. Aí rolou um stress e me falaram: olha, não tem helicóptero, se você quiser ir, é assim.”
“Era um desafio meu saber se ia ou não encarar e o que iria conseguir trazer de lá. O legal mesmo é ir sem saber o que vai acontecer.” Logo na chegada, o impacto visual, físico e emocional fisgou a equipe.
Acompanhado do stylist David Polak e da PR Helga Fuchs, Alberto entregou aos índios três caixas de roupa para distribuir na tribo. Ao final do processo, uma conexão estava estabelecida e Alberto já sabia que história contaria em seu desfile de verão. A ideia com o desfile é também divulgar o festival Mariri Yawanawá.
Como essa vivência aparece nas roupas? Não de forma literal, ainda bem, mas por meio de elementos caros à cultura indígena e aspectos da natureza. O kene, desenhos que possuem significado espiritual, os acessórios que os índios fazem com miçangas e um espetacular senso de padronagem aparecem nas estampas, além de referências a formigas, andorinhas, borboletas e outros animais fáceis de encontrar na aldeia. Curiosamente, os bordados inspirados nas referências indígenas foram produzidos na Índia. “Fui pra lá em janeiro e desenvolvi tudo. Quando você chega em uma fábrica na Índia, eles te apresentam 300 mil técnicas. Tive a ideia no Brasil, mas estava aberto a receber informações de matéria prima de lá”, conta Alberto.
E aberto também a ser inspirado pela tribo, como devemos presenciar nesta segunda.