Há dois anos, José Lins de Melo ganhou uma grande festa do filho Francisco para comemorar seus 90 anos. Vieram parentes de todo o Brasil prestigiar a celebração, entre filhos, sobrinhos, netos e bisnetos, reunindo mais de cem pessoas. Não por acaso. Seu José, que se casou, constituiu família e ficou viúvo duas vezes, sempre nutriu atitude de generosidade, gentileza e caráter no trato com familiares, amigos e conhecidos.
Pernambucano, veio ao Acre em 1942 para extrair seringa, tornando-se Soldado da Borracha. No Seringal Iracema, em Xapuri, pegou malária – “na época se falava ‘paludismo’”, lembra – que demorou a sarar. Decidiu vir morar em Rio Branco e estabeleceu-se na região da Vila Ivonete. Há 40 anos reside na área rural, nas proximidades da capital.
Resistindo à tentativa de Francisco atraí-lo para a cidade, na sua “colônia” ainda cria gado, atividade à qual sempre gostou de se dedicar e sobre a qual acumulou muitas histórias. Uma das mais emblemáticas sobre os valores que cultiva foi relatada por um vizinho de propriedade.
Ele conta que um bezerro de José fugiu para a terra contígua. Como os cavalheiros mantinham relacionamento cordial e ambos tinham ciência do fato, nem José quis buscar o garrote, evitando qualquer animosidade, e nem o vizinho se negou a cuidar dele.
Tempos depois, o homem foi visitá-lo:
– José, aquele seu boi tá no ponto. Como eu vou vender algumas cabeças, pensei em incluí-lo no negócio, se você concordar. Posso acertar agora – e tirou do bolso a quantia correspondente ao preço do animal.
Embora para muitos hoje em dia um comportamento honesto seja sinônimo de tolice, tornando-se até motivo de chacota, algumas pessoas felizmente ainda fazem questão de mantê-lo como princípio. E, neste caso, aliado à inteligência, gerou um acordo perfeito. Pois, diante da oferta do vizinho, seu José respondeu sem hesitar:
– Meu amigo, me pague apenas o preço do garrote, que era o que eu tinha. Quem criou o boi foi você.