Cogitar um método de ensino que contemplasse todas as classes sociais e as inserisse em um mesmo sistema educacional deixou de ser um sonho e tornou-se realidade há cerca de nove meses no Acre. O tempo em que era distante imaginar os jovens acreanos com atividade em tempo integral na rede pública ficou no passado, e hoje a real situação de mais de 3.760 alunos pode ser definida como um divisor de águas no futuro desses adolescentes.
Por enquanto, sete escolas de Rio Branco trabalham com o novo sistema de ensino médio. A meta, conforme o governo do Estado e a Secretaria de Educação e Esporte (SEE), é que a metodologia se estenda para o ensino fundamental, zona rural e também para os municípios em 2018.
O processo de adaptação ao novo modelo não foi simples, a começar pelos professores, servidores de escola e, por último, os estudantes. Trata-se de um processo lento de construção, que começou muito antes, com a formação de professores e a estruturação das escolas.
Segundo o secretário de Educação, Marco Brandão, uma ruptura do modelo tradicional de ensino que transformou o processo de ensinar e aprender, instigando e valorizando o desenvolvimento das competências e habilidades dos jovens no mundo moderno.
“A implantação é um marco histórico na educação acreana. Porque não se trata apenas de ampliar o tempo de permanência dos estudantes na escola, mas de repensar as práticas pedagógicas com o intuito de redimensionar o tempo e os espaços escolares”, destaca Brandão.
Alunos protagonistas
Erik Bernardo, 20 anos, e Lorrana Rocha, de 16, estudantes da tradicional Escola Jovem Humberto Soares da Costa, na capital, optaram por aprender em tempo integral. Para isso, decidiram migrar de instituição para fazer parte do novo modelo e só se arrependem de não terem conhecido o sistema antes.
“A única coisa ruim de estar no terceiro ano é que ano que vem eu já não vou mais estar aqui na escola. Essa é a pior parte, deixar todos os projetos que a gente tem na escola”, conta Erik, que tenta participar do máximo de atividades na instituição.
A vida escolar que Erik e Lorrana têm hoje é o salto de que ambos precisavam para acompanhar a implantação de um método completo e promissor no estado. No início, a mudança assustou os alunos que ainda não estavam acostumados a passar a maior parte do dia dentro da escola.
No entanto, com o passar dos meses, o que era “novo” passou a ser essencial na vida desses jovens. “Escolhi estar aqui porque sei que vou estar melhor preparada para o mercado de trabalho. Tive muitas surpresas boas. Se eu pudesse aconselhar um jovem a fazer parte desse ensino, eu lhe mostraria como é estar numa escola de ensino integral, e ele veria que não é um bicho de sete cabeças que ele imagina”, relata Lorrana.
Os estudantes ainda destacam a possibilidade de associar a vida social com a vida escolar neste método de ensino.
Reforma do ensino médio
A ideia de permanecer o dia inteiro na escola ainda assusta alguns adolescentes que não conhecem a rotina do ensino integral. O medo do novo é o que atrapalha, muitas vezes, a oportunidade de passar manhã e tarde adquirindo conhecimento em áreas que vão muito além da língua portuguesa e da matemática e afetam diretamente o comportamento de cada aluno, apresentando-lhes, em forma de projetos sociais, a melhor maneira de viver em sociedade.
“No começo eu me preocupei com o fato de ter que passar o dia na escola, achei que ficaríamos apenas dentro de uma sala tendo aula com os professores. Só que aí nós vimos o quão diferente seria nossas vidas com o ensino integral. Disciplinas novas, projetos totalmente diferentes do que estávamos acostumados, um mundo totalmente novo e empolgante”, acrescentou Lorrana.
As aulas extracurriculares são a grande proposta do modelo integral de ensino. As matérias eletivas e as dezenas de clubes que compõem o estudo orientado são um estímulo na vida escolar desses alunos. “É muito legal você chegar em casa com a sensação de estar cansado, mas de que aproveitou o dia”, diz Erik.
O jovem não pensou duas vezes antes de se inscrever na eletiva “Na Zona da Comunicação”, umas das disciplinas escolhidas por ele e os colegas para se aprofundar no período da tarde, em dois dias na semana, e que o ajuda no hobby preferido: postar vídeos na internet.
Os que sonham em realizar alguma atividade relacionada à dança e à música, também encontram oportunidade de estudá-las na escola de tempo integral, onde descobrem a importância desses saberes na construção do conhecimento e da interação entre colegas de sala.
As disciplinas eletivas, escolhidas pelos alunos da escola, e os clubes, que cuidam de projetos (ciência, autoajuda, língua estrangeira, teatro e dança), complementam os estudos tradicionais.
Adequação
A carga horária estabelecida na proposta curricular feita pelas secretarias estaduais atende, no mínimo, 2.250 minutos semanais, com um mínimo de 300 minutos semanais de língua portuguesa, 300 minutos semanais de matemática e 500 minutos dedicados a atividades da parte flexível por semana.
Para aderir, o Acre apresentou um projeto pedagógico, que fora avaliado pelo Ministério da Educação (MEC), junto ao desempenho das escolas do estado. Para se manter no programa, as escolas devem apresentar redução da média de abandono escolar e reprovação cumulativa, conforme dados do Censo Escolar.
Para o secretário Marco Brandão, o ensino integral representa um novo tempo para a educação pública acreana. “Essa é a escola jovem, que tem a identidade dos nossos jovens do século XXI, que são multifuncionais, que evoluíram nas atividades. Aqui ele é nosso protagonista e participa do processo de construção do conhecimento.”
Investimento
Para efetivar o modelo no estado, o governo do Acre investiu R$ 28 milhões. Desses, R$ 7 milhões provenientes de verba federal, e os outros R$ 21 milhões, de recursos próprios do estado.
Escolas contempladas
As escolas estaduais que passaram a ter tempo integral no primeiro semestre deste ano são: Armando Nogueira, Glória Perez, Instituto de Educação Lourenço Filho (IELF), José Ribamar Batista (Ejorb), Sebastião Pedrosa, Humberto Soares e Boa União.