Segunda-feira, 5 de junho, o governo do Acre celebrou num encontro no auditório da Biblioteca Pública, não apenas o dia, mas o mês do meio ambiente, com otimismo e resultados. Na ocasião, o governador Tião Viana surpreendeu ao assinar dois decretos que avançam no direção do desenvolvimento sustentável. Um cria nova área de preservação ambiental, com cerca de 155 mil hectares, margeando a BR-364 entre os municípios de Manuel Urbano e Feijó. O outro institui uma Comissão para fazer a revisão e atualização do Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE), elaborado há mais de 10 anos e que tem sido fundamental instrumento de planejamento regional.
O clima do evento contrastava com os cenários da crise nacional e internacional, cujos cabeças mal formados estariam representadas por nomes como Michel Temer e Donald Trump. O auditório estava lotado e, entre os convidados a compor a mesa, havia governador, senador, empresário, índio e seringueiro, todos, aparentemente, protagonistas vencedores.
Essa é uma história que começa em 1999, quando o hoje senador Jorge Viana ganhou as eleições em 1998 e passou a abrir os caminhos da sustentabilidade do Acre até 2006. Depois veio Binho Marques, com um mandato até 2010, e Tião Viana, a partir de 2011, com segundo mandato que se encerra em 2018. Nestas quase duas décadas, o estado se tornou referência ambiental na Amazônia, no Brasil e no mundo.
Por isso, havia história e identidade na plateia. Esta chegou a se levantar e aplaudir de pé, demoradamente, o doutor José Fernandes do Rego, com mais de 80 de idade, que no começo dos anos 1970 chegou ao Acre, vindo do Rio Grande do Norte, e exerceu vários cargos públicos, introduzindo conceitos científicos na tradicional cultura acreana. Ele recebeu um certificado do governador por essa enorme contribuição, que ainda não terminou. Até porque sua filha, a promotora Patrícia Rego, segue com brilho a trilha do pai. “O Acre é a luz no fim do túnel neste momento de retrocesso legislativo na área ambiental”, disse ela.
Como pano de fundo da política de resultados há a figura lendária do seringueiro Chico Mendes que, como escreveu o pensador e escritor acreano Toinho Alves, defendeu a mata ameaçado por fazendeiros do Sul e Sudeste, nos anos 1970, dando “um grito no ouvido do mundo”. O militante, professor e filósofo Marcos Afonso, convidado a falar sobre o grande líder da floresta, procurou a filha dele, Angela, na plateia e a levou até a tribuna, após o que fez a pergunta: ”Onde Chico Mendes estaria sentado neste momento”?
“Aqui, ao nosso lado”, respondeu de imediato o governador Tião Viana.
Por certo que sim, porque lá estavam também um velho companheiro de Chico Mendes, o hoje diretor-presidente da Cooperacre, Dionizio Barbosa (Daou), uma cooperativa de extrativistas que obtém enorme sucesso com a produção e comercialização de produtos da floresta, notadamente, da castanha-do-brasil; o engenheiro agrônomo e chefe local da Embrapa, Eufran Amaral, filho de seringueiro; o senador Jorge Viana, que na direção da Fundação de Tecnologia do Acre (anos 1980) ajudou Chico Mendes a elaborar projetos e conseguir um caminhão para transporte de castanha e borracha; o jovem indígena Zezinho Yube, do grupo Huni Kui, que integra a equipe de governo e ajuda no planejamento de verbas para as aldeias.
A propósito, o governo Tião Viana, que em 2011 parecia ter pouca afinidade com as questões ambientais, hoje se destaca com o financiamento das cadeias produtivas sustentáveis em áreas já degradadas, na construção de escolas indígenas, em obras de saneamento em municípios isolados, na formação de agentes agroflorestais e não se cansa de falar de seus amigos indígenas, chegando a participar de festejos em aldeias remotas. O governador garante que até o fim de 2018 terá destinado a soma de 75 milhões de reais em projetos dos diferentes grupos indígenas do estado, o que é inédito no pais.
Bom, para esse desempenho com indígenas ele conta com uma trupe de renomados indigenistas que fizeram e fazem história no Acre: Terri Aquino, Marcelo Piedrafita e José Carlos Meirelles. Além dos chefes que tem visitado com frequência em aldeias nos altos rios.
Outros tempos
O Acre tem muita história de sucesso na área ambiental, muitas delas conduzidas pelo longevo secretário do Meio Ambiente Edegard de Deus, também presente e aplaudido. A mais recente é a que trata da economia de baixo carbono, que começa a receber dólares de países ricos e poluidores, como compensação, para melhorar a vida daqueles que vivem nas entranhas da floresta. Ou seja, o passivo florestal do estado vira mercadoria qualificada sem sair do lugar, ao mesmo tempo que preserva o planeta.
Por essa e outras chamou atenção na celebração do meio ambiente a cordialidade entre pessoas que não precisam ser sempre cordatas entre si. Deu para perceber, por exemplo, a troca de reconhecimento e pontos de convergência entre os irmãos Jorge e Tião Viana. Jorge não poupou elogios ao trabalho que Tião vem desenvolvendo em meio à crise em que está mergulhado o país: “Estamos vivendo um momento muito perigoso”, disse, ao referir-se ao caos político instalado em Brasília, reconhecendo, ao mesmo tempo, o acerto da gestão do irmão que “alegraria o coração de Chico Mendes”.
Já Tião Viana lembrou que a partir de 1999, “Jorge Viana estabeleceu os instrumentos de luta em defesa do Acre e da Amazônia”. E explicou, referindo-se à sua equipe e convidados, que “nós nunca vamos nos incomodar com os pontos de divergência essenciais à democracia”. Um pouco antes, a filha de Chico Mendes disse que o pai ficaria triste com os retrocessos que acontecem hoje no país, sob a batuta de Michel Temer, e pediu que todos ajudassem a cultuar a memória de Chico Mendes, cujo desaparecimento completará 30 anos em dezembro de 2018.
O governador, que gosta de ler e recomendar a leitura de livros sobre política e desenvolvimento, citou Euclides da Cunha ao refletir sobre os problemas que o mundo vive hoje: “É a civilização que nos apavora”! – disse. Quando se referiu ao líder seringueiro, que considera seu principal inspirador, disse que esse momento será de saudade e dor, mas também de esperança. E completou: “Ele não era um homem triste”.
Elson Martins é jornalista